quinta-feira, 8 de julho de 2010

segredo (ou confissão)



entre portas. a noite é um luar perfeito desenhado nas frestas da madeira. ao longe sabe-se que há uma árvore. onde outrora existiu um poço. e onde muito antes disso havia uma fonte. só a árvore permanece. com cerejas nos ramos. e nas folhas o verde primaveril o amarelo outonal e uma brisa morna sacudindo raízes. agarradas ao chão. entre portas. a porta da esquerda. a porta da direita. uma delas abre-se primeiro. sai de lá uma voz. hoje vou agarrar em ti e levar-te comigo num sonho. encostada à ombreira da segunda porta que se abre depois. uma outra voz. mais delicada e mais doce. como o fruto que amadurece na boca. como o gosto que fica no sabor dos lábios. sabes a que nos leva esse sonho. nem onde nem porquê. sem motivo. as duas vozes em diálogo. em uníssono. amanhã e sempre. porque se no início era o verbo. agora o início é não verbal. é uma imagem de olhos a olhar noutros olhos. são dois pares de estrelas cadentes. o fogo é isto. uma certeza a atear tudo em volta. imprevisível. tens a certeza. numa das vozes. tenho. na outra. deslocam-se assim em direcção à árvore. que já foi poço e outrora fonte. a risca cinzenta esbate-se à medida que avançam. as portas ficam abertas. a noite continua perfeita. e o luar permanece. com o som invisível de uma chave pendurada no coração. a embalar os corpos. finalmente pelo mesmo caminho. felizmente. tic tac.


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