domingo, 9 de maio de 2010

relâmpago (ou a sombra branca do amor)



um homem e uma mulher. um sofá e uma cadeira. ele está deitado enquanto ela se vai baloiçando num compasso crescente. trocam olhares. mas nem ele nem ela se vêem. trocam palavras. mas nem um nem outro conseguem manter a conversa. não trocam gestos. e nenhum dos dois se consegue tocar. porque a distância é aquilo que lhes sobra da solidão dos corpos. às vezes trocam de lugares. ele sentado e imóvel. ela deitada e distante. porque o horizonte é apenas uma imagem só ao alcance da distância que os mantém ali. por que razão. é longa a busca de um que procura através do outro o que os dois não encontram. ouvem-se perguntas. e ecoam-se dúvidas. falham as certezas. vence o silêncio. e as réplicas latentes do desgaste. do fracasso. são voltas e voltas. de volta ao começo. ele procura a chave. ela não encontra saída. ou vice-versa. estão ambos perdidos. às cegas. mais tarde ou mais cedo um deles cairá. entre tanto. há um pano que flutua até ao chão. com ela. e luzes que se apagam. com ele. na sala de estar o sofá vazio e a cadeira esquecida. enquanto a noite lhes devolve as violentas colisões do pensamento. agora uma cama num espaço fechado. e duas cabeças naufragadas. um homem e uma mulher acordados. até que um deles cai à beira da cama. um segura e agarra a mão do outro. é noite escura. entretanto. sem pensar agora por que razão. num sonho. de tão cansados adormecem. ele vira-se para o lado dela. ela respira como se sorrisse. de mãos dadas contam o tempo pela soma de todas as verdades e não para tornar mais verdadeiro o que às vezes já é demasiado real. a meio do sono reencontram-se. ao irromper do crepúsculo perderão o medo. sem mais nada. a dois. para sempre.


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