terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Poema II



Hoje,

nada de metáforas. Nada de palavras crentes, senão

[unicamente o ventre em que a palavra brota de dentro.

Incansável, a meditação e a melancolia de cada sentimento

[desperdiçado.

Pensante, e muito pausadamente a emoção nomeada. Dissecar devagar

As vezes, inteiras, em que chegavas de ti e não querias partir. Porque

Nunca soube se virias para ficar.]

Vão os dias em que a membrana que nos reveste

Era a premonição de uma demora invisível. Desmedida.

Permanece o brilho da chuva sobre os passos.

Detêm-se os perfis da letargia de momentos solitários.

Hoje,

[no útero da solidão, uma sentença e um castigo.]

Inútil deixar o contacto. Infrutífero permitir o toque. Vão:

O mesmo coração não nos cabe.

Pertencemos ao passado e somos feitos de matéria morta.

[a impossibilidade que alimentamos é mera e exclusivamente

Um bafejo que passa de uma boca a outra sem som.]

E há na totalidade dos gestos uma mudez. Um uso cansado.

A consumação de que nada pode justificar o golpe e a sonância de ter que

[nascer, novamente, em outros braços num corpo distante. Porque

Já não nos conseguimos lembrar e ter a certeza de o termos feito.]

Hoje,

Será tudo o que fizermos.

Para sempre, uma resistência consagrada no interior dos muros

[a cal

da eternidade.]

1 comentário:

Ana Margarida Cinza disse...

Sinto-me lisonjeada ao saber que atrás de palavras que me fluem, consigo arrastar na corrente das minhas (in)certezas atentos leitores que me tenta descortinar, sem saber muito para além do que é escrito nas minhas páginas com fundo negro...

Fico feliz por saber que nas minhas verdades, outros se descobrem também, e as interpretam da minha e da sua própria maneira...

Também já te tinha lido, através do nosso amigo comum, mas nunca me sentira "à vontade" para comentar algo duma pessoa que não conseguia descortinar...Por isso, aproveitei para eu própria me descortinar e agradecer-te por momentos como estes:

" «Sou todos os dias em que me ignoras. Em que és uma distância intocável. A cortina e o pano, corridos, um vácuo de esperança que avança penitente em cada um de nós.»


Vazio. Sentado na cadeira à espera dela.
Para que chegasse nem que fosse ao fim da tarde, no final do dia.
Esperar.
-
A angústia daquele silêncio.
O silêncio e o fumo que se entranhavam horas a fio.
E ela, sem aparecer.


Escrevo-te, amigo, e poderia dizer que sei quem és e te conheço. Mas o que haverá para encobrir? Que necessidade tem a poesia de referir o mistério, ao invés da crueza duma só palavra.


Acendo a luz e desabafo um primeiro suspiro na tua
ausência.
Faz hoje muito tempo desde que te foste embora.


A consumação de que nada pode justificar o golpe e a sonância de ter que
[nascer, novamente, em outros braços num corpo distante. Porque
Já não nos conseguimos lembrar e ter a certeza de o termos feito.]"

vou estar-te atenta.*