domingo, 23 de março de 2008

Dies Solis


Noites num mesmo pensamento. Num ligeiro sopro, profundo e infinito.

Quase que de olhos vendados, da boca ao ouvido num segredar discreto

às cegas e às escuras condenado
como que amarrado às cicatrizes e às impossibilidades

desejadas
de cada grito interior.

Branco. Qual a cor do sentir?

A tonalidade profana das emoções? Quando é tudo branco?

Ou quando tudo sobeja o branco?

A negro, houvesse um desfecho para a consciência, e
da demência, que razão?

Mais: as vozes que ouço não são as vozes que procuro. Embora a reflexão seja feita através de imagens. E de mãos, que as trago cheias de derrotas.

Algumas, âmbar e fragmentos de frágeis momentos a

branco.

Nessa noite escura,
em Inverno nos olhares tristes de todos os que nunca conheci.

Chovem dilúvios, há neve nas ruas.
A pele antecipa o sol, nas folhas que estão por escrever, frias.

E indiferentes ao gelo, as lágrimas ocupam sempre um estranho lugar
na brancura dos dias que se repetem madrugadoramente.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Fados





I

Nada mais me desespera
quanto uma guitarra de silêncio,
desgarrada
na voz da rapariga pálida que à janela
expõe os versos da (sua) vida parada.

Sempre que passo à beira do esquecimento
dos finais de tarde,
carrego nos ombros os dias de trabalho;
tão próximos do cansaço e da rotina.

E, assim, avanço por essas ruas calcetadas
por pedreiros e homens falecidos,
também eles esquecidos, em cada passo
que se pisa sobre a obra.

As escadas estreitas,
o alcatrão esbatido ao sol
na sombra íngreme de (…)
e as pessoas velhas

- de cabelos brancos e olhares baços -

presas
ao beiral das suas casas pequenas
cheias de murmúrios lentos,
antigos,
de vozes (es)corridas de experiência;

E, na minha impaciência,
de às vezes
alongo-me no torpor fumegado da caminhada de regresso

observando-te

inerte e perdida em versos
que a idade não te deixou calar.

Cantas como sempre te conheci,
e ao ouvir-te
sinto-me como se nunca encontrasse
o caminho de casa.


II

Recorro aos bolsos do casaco do tempo.

Toco as chaves,
mas pressinto o vazio das minhas
horas,
de ventos e sopros longos de ninguém.

Não quero, já
saber quem me fala
nem que outras bocas tentam
dizer qualquer coisa.

Não quero, ainda
responder,
prefiro ouvir (…)